Mais uma excelente articulista para o nosso time. Este artigo inicia a série de contribuições de Renata Barreto, economista e jornalista do site InfoMoney. E nada melhor do que começar com um tema básico e clássico, fácil de compreender para alguns, nossos leitores inclusive, mas infelizmente ainda de difícil compreensão para uma boa parte da sociedade que durante décadas foi tratada e adestrada como mera massa de manobra.
Boa leitura,
V.D.
Socialismo e liberdade não cabem na mesma frase
Por Renata Barreto
É comum ouvirmos por aí as palavras socialismo e liberdade na mesma frase, até em slogan de certo partido de esquerda brasileiro, tal como fossem complementares e desejáveis por aqueles que gostariam de implementar um sistema socialista. Acontece, caros leitores, que é impossível associar as duas coisas.
Uma coisa que poderão notar em meus textos é serem pautados por uma chamada à realidade, de forma que possamos parar de nos enganar com armadilhas tão óbvias. Tal como muitos faziam quando a crise que vivemos hoje batia à porta ou tantos outros que acham que é possível viver de otimismo sem entender o que de fato é necessário. Muitos são os que tentam adequar a realidade ao modelo que enxergam como ideal, quando na verdade o oposto devia ser feito. Sabe aquela história da fábula da cama de Procusto, onde ele cortava as pernas de quem não cabia na cama de ferro de sua hospedaria? Basicamente é a mesma coisa que fazem na tentativa de encaixar o modelo do socialismo com liberdade. Como é impossível de um caber no outro, cortam suas pernas. Vamos por partes.
A primeira coisa que devemos entender aqui é o que de fato é o socialismo. Esse modelo prega que os meios de produção e propriedades sejam coletivizados, ou seja, na verdade ninguém seria dono de absolutamente nada, exceto o Estado, de forma que este pudesse definir para onde iria o investimento, como as coisas devem ser feitas e controlar todo o sistema. Os que defendem esse modelo alegam que assim haveria menos desigualdade e menos pobreza. Aí que está! Desigualdade não é um problema, desde que não haja pobreza. Além disso, colocar todo mundo sob o mesmo escopo elimina a essência individual de cada pessoa, retira dela seus dons naturais e a transfere para um mundo em que apenas o coletivo importa. E qual o problema disso? Chegaremos lá.
Um conceito muito importante de microeconomia que serve para tudo é o de utilidade marginal. Basicamente, este conceito diz que cada coisa, cada produto, cada serviço, tem uma utilidade diferente para cada pessoa diferente, fazendo com que essas pessoas atribuam um “preço” diferente para elas. Podemos colocar o trabalho sob esta análise também, já que sempre vai existir uma pessoa mais preguiçosa, para a qual o trabalho tem menos importância do que passar o dia inteiro dormindo e, sempre vai ter a pessoa que, ao contrário do primeiro, gosta de produzir e se sentir útil, tendo como motivação a recompensa, que geralmente é o dinheiro (o preço do trabalho) e também o de construir alguma coisa. A utilidade marginal do trabalho é totalmente diferente para o sujeito A e o sujeito B e, portanto, colocar ambos sob o mesmo regime e querer que tenham as mesmas recompensas, fatalmente dará errado. O socialismo anula o ser humano em suas potências e, ao ignorar nossa natureza, cria uma sociedade artificial e doente.
No capitalismo, justamente pela propriedade privada ser garantida, ou seja, o capital é de alguém e há liberdade de trocas, existe uma real formação de preços através da oferta e demanda, refletindo as preferências dos consumidores e esse capital empreendido será direcionado de acordo com essas preferências. Como no socialismo os preços não são definidos pelo mercado para bens e serviços, não dá para conhecer a fundo a situação real e ter uma estratégia razoável, criando uma realidade artificial. Possivelmente haverá problemas e dispêndios desnecessários que não serão corrigidos, o Estado inchado beneficia apenas os que estão dentro dele, além do grande problema de, pelo fato de as empresas serem de monopólio estatal e não terem lucro como objetivo, diminui muito a eficiência da produção. Num sistema capitalista, é de interesse particular que a empresa obtenha lucro, senão não há motivos para a existência da mesma e, com isso, sempre haverá melhorias em todos os âmbitos, procurando suprimir os gargalos e ineficiências, desenvolvendo novas tecnologias, criando soluções, entre outras coisas. A diferença crucial entre os dois sistemas está na produção do que a sociedade quer e não do que o Estado julga que a sociedade quer, sem de fato levar em consideração o desejo desta. Veja o caso de Cuba, com muitos médicos e problema de abastecimento de alimentos, por exemplo. Quem definiu essas prioridades?
Há problemas no capitalismo? Sim, é claro, mas apenas através de geração de riqueza poderemos diminuir a pobreza. E por que a desigualdade não é o problema principal? Basicamente porque algumas pessoas se destacarão e serão responsáveis por gerar empregos para outras medianas. Você acha que, por exemplo, Bill Gates deveria ganhar o mesmo salário que você? Ele se arriscou, pesquisou, inovou, teve ideias brilhantes. Não por acaso é um bilionário, que por sinal contribui muito com a sociedade através de sua fundação de caridade. Eu não tenho problema nenhum com pessoas mais bem-sucedidas e com mais dinheiro que eu. Em vez de invejá-las, as admiro, procuro saber suas histórias e quero fazer por mim algo construtivo que me gere, além de satisfação pessoal, renda suficiente para fazer o que gosto. É muito importante saber que todos nós somos diferentes em nossa essência individual e que o que serve para mim, não necessariamente serve para você ou qualquer outra pessoa. É por isso que colocar todo mundo num mesmo nível (de pensamento, ideias, produtividade e capacidade) anula a coisa mais preciosa do ser humano, a liberdade de escolha.
E por que então falo que socialismo e liberdade não podem coexistir? A resposta não está bem clara? Se o Estado é quem comanda tudo retirando a liberdade individual de cada um de empreender, expandir, criar e inovar, seremos todos robôs de um sistema pernicioso. E qual o efeito de tudo isso? Basta olhar nosso vizinho, a Venezuela. Não há comida suficiente, as empresas foram ou estão indo embora, há racionamento de alimentos, remédios e outras coisas, não há emprego, não há vida digna. 87% da população, em pesquisa recente, não tem renda suficiente nem para manter uma alimentação minimamente satisfatória e quase 30% vivem em pobreza extrema. Que beleza de igualdade, não é mesmo? Todo mundo miserável e sem acesso ao básico para se viver com dignidade. Enquanto isso, a classe política se esbalda com dinheiro público vivendo no luxo, enquanto na propaganda dizem se importar com os pobres. Soa familiar?
Além das questões mercadológicas que inviabilizam o socialismo e suprime a liberdade individual, ainda há o fato de que essas políticas não conseguem ser realizadas sem uso irrestrito da força e quebra da democracia. Não há democracia num local onde apenas exista uma opinião e isso é o exato oposto de liberdade. Liberdade é poder usar nossas características únicas em um sistema de trocas voluntárias. Liberdade é poder usar a cabeça para criar, empreender e inovar. Liberdade é poder escolher como queremos viver.
Liberdade! A palavra mais bonita do dicionário. Se o socialismo tira a essência do indivíduo, na verdade cria apenas uma prisão travestida por um sonho de igualdade. Tal como água e óleo, socialismo não se mistura com liberdade.
Eu só quero ser livre.