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Johnny Ramone, um punk conservador

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Texto Original: http://blogreaca.blogspot.com.br/2015/11/johnny-ramone-um-punk-conservador.html

O que a maioria conhece dele é o visual largado, o cabelo comprido o jeito rude. Sempre de jeans e All Star, Johnny Ramone criou um estilo aparentemente despretensioso que se eternizaria como sinônimo de rebeldia. Segundo o que ele contou em sua autobiografia, nada era por acaso: as roupas, as expressões faciais, tudo foi pensado nos mínimos detalhes. Nunca escondeu que a música ocupava o segundo lugar em sua vida: sua paixão era o beisebol. Fanático pelo esporte, ele era grande fã dos New York Yankee's e do Los Angeles Dodger's. E mas curioso ainda: era um conservador convicto.

Johnny nasceu em 1948, em Long Island, Nova York. Foi registrado com o nome de John William Cummings. O pai era de origem irlandesa e a mãe de origem italiana. Foi criado no bairro de Forrest Hills, Queens. Cresceu em uma vizinhança composta majoritariamente por operários, entre eles seu pai, que atuava na construção civil. Assim como no Brasil, esses ambientes apresentam um contexto contraditório: a parcela da população menos favorecida vive o paradoxo de defender valores conversadores, ao mesmo tempo em que vota na esquerda. Assim era no Queens. Johnny contou que a sua família foi a única de origem italiana a votar em Richard Nixon. Foram justamente os valores familiares que impregnaram o pensamento de John até o resto de sua vida. Diferente de seus companheiros de banda, não bebia, não fumava e condenava o consumo de drogas. Conduzindo o grupo com mão de ferro, não permitia o consumo de álcool antes dos shows. Segundo Dee Dee Ramone relata em sua autobiografia “Poison Heart: Surviving the Ramones”, Johnny era um verdadeiro ditador, mas foi justamente sua conduta fimre que manteve a banda nos eixos. Talvez no caso de Dee Dee a preocupação de Johnny fosse legitima, visto que o baixista morreu de overdose de heroína aos 50 anos.

Na adolescência, foi influenciado pela cultura greaser, de onde provavelmente se inspirou para elaborar sua indumentária característica. Trabalhou como encanador com o pai, além de passar por um colégio militar e frequentar a universidade na Florida antes de conquistar o reconhecimento público. Antes dos Ramones, tocou na banda Tangerine Puppets com Tommy Ramone (Tamás Erdélyi). No entanto, a principal influencia musical de Johnny foram Os Stooges de Iggy Pop. John Cummings se inspirou em Paul McCartney para adotar o nome da banda que fundou com Dee Dee (Douglas Glen Colvin). O beatle se registrava em hotéis com o nome de Paul Ramon.  Pensando em uma carreira grandiosa, Johnny elaborou um visual e uma narrativa para a banda que quebrasse os paradigmas, ao mesmo tempo em que trazia uma nova linguagem ao cenário musical. Ao final, a ousada estratégia comercial do guitarrista capitalista se tornou a base do ideário punk: a suposta rebeldia elaborada para vender a música dos Ramones se tornou identidade de um movimento que majoritariamente prega o anarquismo e socialismo. Durante as jornadas de Junho , quando às ruas das principais cidades do país foram tomadas por manifestantes, ou mesmo nas grandes manifestações de Seattle ou Genova em 1999, se viam vários jovens ostentando camisetas dos Ramones enquanto atacavam os chamados símbolos do capital. Se quisessem ser mais efetivos e coerentes, essas pobres almas deveriam começar rasgando suas próprias camisetas.

Os valores conservadores que aprendeu dos pais se traduziram na postura política que manteve pelo resto da vida. “Fui criado como Republicano”. Ainda nos anos 60, o adolescente Johnny observou que os eleitores se seduziam por John Kennedy mais pela aparência e pela bela propaganda do que pelas ideias que pelas propostas que o democrata apresentava para o país. Depois da fama, nunca se furtou a demonstrar apoio aos Republicanos, em especial Ronald Reagan e George W. Bush.  Afirmava ter votado em todos os candidatos republicanos desde que começou a exercer os seus direitos de eleitor. Dizia que Ronald Reagan foi o melhor presidente que vira em toda a sua vida. De Bush, a frase mais emblemática e polemica foi dita quando os Ramones foram indicados ao Rock and  Roll Hall of  Fame, em 2002. Johnny aproveitou que estava no reduto da esquerda americana para marcar sua posição: encerrou o discurso dizendo “Deus abençoe a América e o presidente Bush”. 

Ele devotava uma aversão quase religiosa aos comunistas e a esquerda de maneira geral. Em seu julgamento, aquelas ideias só poderiam ser compradas por ingênuos. “As pessoas sempre se inclinam para ideias liberais quando jovens. Só espero que mudem quando descobrirem como é o mundo real”.
A postura conservadora obviamente contrastava com a mística revolucionária que se criou em torno do movimento punk. O guitarrista contava que certa vez dirigia o seu Cadillac quando foi parado por um fã indignado com tamanha ostentação. O jovem teria questionado o músico alegando que aquilo era contraditório com o punk, ao que Johnny respondeu solenemente “Eu escrevi o livro sobre ser punk”. Entendia que as ideias socialistas e comunistas deveriam ser combatidas todos os dias. Era membro da NRA (Associação Nacional do Rifle), defendia a instituição da família, a pena de morte e a proibição das drogas, além de ter tornado popular a camiseta com os dizeres “Kill a Commie for Mommy”

A imprensa não perdoou, mas ao que parece, o músico deu de ombros. Johnny sempre nutriu um desprezo soberano pela esquerda americana e pelas ideais socialistas. Sem medo do debate ou do que a mídia pudesse dizer sobre ele, não se furtou a atacar de maneira direta um repórter da revista Creem que tentou constrange-lo por conta de sua declaração de apoio ao candidato à presidência Ronald Reagan. Percebendo a indignação do entrevistador com o discurso contraditório, o guitarrista antecipou a postura firme que Ted Cruz adotou no debate da CNBC, perguntando ao repórter: “Cadê a sua carteira de filiado do Partido Comunista?” Em um meio tão enviesado, Johnny se impôs contra tudo e contra todos. Mesmo tento amigos progressistas como Eddie Vedder e Rob Zombie, ele colocava acima de qualquer coisa. Quando Slim Jim Phantom (baterista do Stray Cats) reclamou dos impostos cobrados pela administração de George W. Bush, Johnny retrucou: “Os impostos estariam ainda maiores se não fosse o presidente Bush”.

É evidente que a postura conservadora que irritava a imprensa mainstream serviu para acirrar ainda mais os ânimos dentro da banda. Johnny vivia sob uma rígida disciplina aprendida nos tempos de colégio militar, ao passo que Joey sofria de transtorno obsessivo compulsivo. Joey era um convicto liberal (no sentido americano). Desde a fundação da banda em 1974, os dos protagonizavam discussões por conta da divergência em suas concepções de mundo. Em 1985, o lançamento de “Bonzo Goes to Bitburg” foi motivo de acaloradas discussões. A letra que satirizava o presidente Ronald Reagan fora escrita por Joey. O motivo da sátira deve-se ao fato de que naquele mesmo ano, o presidente havia visitado a base de Bitburg, na Alemanha Ocidental. Durante sua visita, Reagan visitou o cemitério da base, onde estão enterrados cerca de dois mil soldados (entre eles, 49 soldados da Waffen-SS). Joey era judeu, e definiu que a visita presidencial era um insulto. O nome é referencia ao personagem Bonzo, um chipanzé que aparecia na comédia Bedtime for Bonzo (1955), estrelada pelo ator Ronald Reagan. Johnny achou o titulo ofensivo, e após algumas negociações, o single saiu nos Estados Unidos como “My Brain Is Hanging Upside Down (Bonzo Goes to Bitburg)”.
A relação dos dois ficou ainda pior depois que Johnny começou a se relacionar com Linda Daniele, ex de Joe. Os dos se casaram em 1994. A amizade de anos foi desfeita para sempre. Os dois manteriam um relacionamento estritamente profissional. Em retaliação, Joey compôs “The KKK took my baby away”, usando a milícia suprematista como alusão ao direitista Johnny. Johnny não compareceu ao enterro de Joey, que morreu de câncer em 15 de abril de 2001. Segundo ele relatou, mesmo com o rompimento ele sentiu muito a morte do amigo. Curiosamente, três anos depois Johnny faleceu também de câncer, no dia 15 de Setembro de 2004 em Los Angeles. Ele tinha 55 anos. Em seu enterro, foi acompanhado por sua esposa Linda e pelos amigos Eddie Vedder, Vincent Gallo. Rob Zombie, John Frusciante. Seu casamento com Linda não gerou filhos. Talvez a melhor frase de Johnny Ramone seja a sua condenação dos direitistas medrosos. “Não sei como eles deixam essas coisas acontecerem. Eles passam muito tempo se defendendo”. De fato nós conservadores estamos sempre nos justificando, como se a defesa dos valores, da pátria, família e liberdade precisassem de alguma justificativa.
A vida de Johnny é fascinante. Recomendamos a leitura de Commando, a autobiografia de Johnny Ramone. Vale cada página.

 


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