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Entenda por que o golpe de estado venezuelano é pior do que parece

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A questão é entre a liberdade ou o despotismo e não simplesmente entre estatização da economia ou livre-comércio.

Por V.D.

Existe autogolpe? Foi um golpe de estado que ocorreu na Venezuela, isto é claro, mas o que significa o estado golpear-se? Faz sentido dizer uma coisa dessas? Faz. Faz porque um estado não é um bloco monolítico, ou seja, algo que não apresenta rachaduras, partes, partes inclusive que por alguma razão estejam em conflito. Pense no Brasil atual, alguém ainda acredita, depois do julgamento do Mensalão, dos processos contra o Petrolão, da Lava-Jato que todo estado brasileiro é bixado? Claro que não. Há funcionários competentes em postos estratégicos que impediram seu completo assalto pela esquerda. Sei sei que passamos por um baita perrengue, mas nem tudo é o caos que os mais conservadores pintam. Aliás, muito cuidado com este discurso, pois ele leva a um fatalismo de que não adianta fazer nada, não adianta reagir. E o que vimos no Brasil foi uma reação histórica. Mas esse é outro assunto... Agora o caso venezuelano é, claro, bem mais grave e veremos na lista que se segue, como o governo de Maduro acaba de sufocar o seu estado de direito com um golpe mais ousado.

  • O golpe foi contra a Assembleia Nacional

A assembleia nacional venezuelana foi a última instância a ser legitimada pelo voto popular. Ou seja, Maduro golpeou a democracia naquele país. Para começar, foi retirada a imunidade parlamentar dos membros da assembleia nacional.

  • O Tribunal Superior de Justiça assume as funções do legislativo

Isso mesmo, separação de poderes para quê? Quem julga, agora também fará as leis. E não por acaso foi esta mesma corte que emitiu decisões que eliminaram a imunidade do parlamento.

Vejamos as decisões ‘judiciais’ para inglês ver, para dizer que têm alguma legitimidade. De acordo com comunicado emitido pela Organização dos Estados Americanos (OEA)[1]:ou reforçar a preservação da instituição democrática no continente americano. Politicamente, ela implica no compromisso dos governos em manter a democracia; historicamente, se adéqua às ações da OEA; sociologicamente reflete os anseios e lutas dos povos pela sua representatividade política; juridicamente, ainda que se trate de uma resolução e não de um tratado corresponde a uma etapa importante no desenvolvimento progressivo do direito internacional.

  1. A primeira destas decisões, emitida em 27 de março de 2017, declara inconstitucional toda a legislação aprovada pela Assembleia Nacional, chamando de apoio à Carta Democrática Interamericana[1] um ato de traição mesmo que seja um documento legal assinado pela Venezuela.

  2. Através de sua segunda decisão, emitida em 29 de março de 2017, a Corte declarou a "Assembleia Nacional desobediente e anulou seus atos". Esta decisão foi tomada sem fundamento constitucional, nem por meio de autoridades concedidas à Assembleia (artigo 187 da Constituição ), Nem os da Câmara Constitucional do TSJ (artigo 336 da Constituição). Viola tanto a separação de poderes garantida pela Constituição como a obrigação de todos os juízes de respeitarem e "assegurarem a integridade" da Constituição (artigo 334).

  3. A seção 4.4 da decisão do TSJ afirma: "Enquanto a Assembleia Nacional permanecer desacreditada e seus atos anulados, a Câmara Constitucional do Supremo Tribunal assegurará que as funções parlamentares sejam exercidas diretamente pela Câmara ou pelo órgão que designa, Para garantir o Estado de Direito ".

  4. Esta decisão viola o artigo 187 da Constituição, que delineia os poderes legislativos da Assembleia Nacional. A Subsecção 24 garante esses poderes de acordo com a Constituição e a lei.

Agora fica fácil entender a expressão Aparelho Ideológico de Estado, pois foi nisto que se transformou a suprema corte venezuelana, em um mero apêndice da vontade de Maduro, o déspota venezuelano.

Trabalhar pela restauração da ordem no hemisfério ocidental é tarefa da OEA e agora se trata de boicotar o governo venezuelano até que Maduro caia. Infelizmente, isto não vai ocorrer sem o recrudescimento do sofrimento de seu povo.

O que ocorre na Venezuela é algo muito mais profundo do que um processo de estatização econômica (o que, aliás, nós temos aqui no Brasil). Quando as regras, funções e postos do estado funcionam harmonicamente para suprimir qualquer possibilidade de dissenso estamos vários passos a frente de um simples governo autoritário centrado na figura de um caudilho, ditador, déspota etc. Se alguém pensou em totalitarismo acertou.

 

[1] OAS press release. Venezuela: OAS SG Denounces Self-inflicted Coup d’État. March 30, 2017.

[2] Aprovada em 2001, a Carta Democrática Interamericana em Lima, Peru objetivou reforçar a preservação da instituição democrática no continente americano. Politicamente, ela implica no compromisso dos governos em manter a democracia; historicamente, se adéqua às ações da OEA; sociologicamente reflete os anseios e lutas dos povos pela sua representatividade política; juridicamente, ainda que se trate de uma resolução e não de um tratado corresponde a uma etapa importante no desenvolvimento progressivo do direito internacional.


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